"o melhor de dois mundos. poesia viajante"
— por Cíntia Moscovich, escritora brasileira [Prêmio Portugal Telecom 2013]

[resenha \ recensão crítica publicada no Zero Hora, 11 mar.2019]



"Lançado no final do ano passado em Portugal e no Brasil pela editora Urutau, o livro de poemas outono azul a sul marca a estreia de calí boreaz na literatura. Ilustrado por dois artistas plásticos, um brasileiro e um português, Edgar Duvivier e António Martins-Ferreira, o livro reúne — literalmente — o melhor de dois mundos.

Com poemas curtos ou muito curtos (como em avião: "na asa azul da saudade / de cá e de lá"), calí tem a brejeirice e a luz das praias cariocas aliadas a um profundo rigor lexical, com a elegância sempre tão cara aos autores lusos.

Nascida em Portugal, a autora decidiu aventurar-se pelo mundo, estudando tradução na Romênia e, depois, no Rio. Essa alma viajante, que ela revela na abertura do livro, resulta em belas e desconcertantes imagens ("converso com versos com o mar que mora entre o Rio de Janeiro e Lisboa, ambas cidades alaranjadas. De tanto olhar o mar, meus olhos se tornaram navios").

O mar, imagem recorrente, assume importância e movimentos diversos, como em marenitude: "moreno mar que me chamas, com sussurros mil / de sereias, à viagem descobridora, / como esquecer a delícia o espanto dessa / hora areia horizonte distante de / canela e caril").

Com um tom feminino — e o "feminino", aqui, quer dizer o aguçamento dos sentidos, um olhar atento e perspicaz, uma riqueza de sentimentos em que o materno e o fraterno se embaralham —, a poeta abraça uma temática reflexiva, sem abrir mão da ironia, como quando conta da noite em que escutava Cartola no Youtube e na qual pensou: "olha: estar convencida / de algo é grande coisa, / eu que, assim, nem convencida estou / de que viver é a coisa certa / a se fazer neste mundo".

Poeta vigorosa, que se esquiva do tom de lamúrias, optando por um texto em que prefere ser protagonista a testemunha, calí boreaz estreia em ótimas companhias. Seu outono azul a sul mereceu posfácio de João Almino, diplomata e imortal da Academia Brasileira de Letras, e orelha da escritora portuguesa Ana Teresa Pereira e dos escritores brasileiros Paula Fábrio e Francisco Azevedo. Bem-vinda a bordo, poeta."


* Cíntia Moscovich, escritora brasileira, nasceu em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, em 1958. Jornalista, mestre em Teoria Literária e vencedora de diversos prêmios, entre os quais se destacam o 1º lugar no Concurso de Contos Guimarães Rosa, os Prêmios Açorianos de Literatura 1999 e 2000, o Prêmio Jabuti 2005, o Prêmio Clarice Lispector da Fundação Biblioteca Nacional 2013 e o Prêmio Portugal Telecom 2013, é uma das principais e mais instigantes figuras literárias do Brasil contemporâneo.






outras resenhas \ recensões críticas ao outono azul a sul:

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